*Diego Silveira Paim
Falar sobre cultura organizacional é sempre um desafio dentro das empresas, ora pela falta de precisão para entender o que é cultura, ora pela falta de habilidade de identificá-la no meio de tantas atividades e pessoas. O que assistimos muitas vezes é o inchaço deste tema por outros assuntos. Tudo é colocado rapidamente “na conta da cultura organizacional”, como se todas as limitações de uma empresa ou todo comportamento exercido dentro dela fossem produto de sua cultura.
Em meio a esse cenário desafiador, podemos tentar esclarecer o que de fato é Cultura Organizacional? Edgar Schein, grande referência do assunto há algumas décadas, foi muito feliz ao sistematizar e organizar esse conhecimento: “Cultura Organizacional é um conjunto de premissas que um dado grupo inventou, descobriu ou desenvolveu ao lidar com problemas de adaptação externa e integração interna, e que funcionaram bem o suficiente para serem consideradas válidas e, portanto, para serem ensinadas a novos membros como o modo correto de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas.”
O autor traz elementos além dos que estão na superfície aparente da empresa, buscando o que é não dito, não revelado prontamente e que pode ser descoberto por meio de um cuidadoso processo investigativo. Ele mostra três aspectos que podemos considerar ao analisar cultura organizacional:
1) Artefatos visíveis: aquilo que podemos enxergar, como layout da empresa, regras e normas declaradas, estrutura organizacional, modelo de remuneração, etc; mais comuns e fáceis de ser analisados, somente nos mostram como um grupo se comporta, mas não por que ele se comporta de tal maneira;
2) Valores: tanto os que são declarados pela organização e muitas vezes disponibilizados em belas paredes, como os que são percebidos no dia a dia por colaboradores; quando os valores incentivados são internalizados pelos colaboradores, eles se tornam inconscientes, o que inaugura nosso terceiro ponto de análise;
3) Premissas e ideologias: não são declaradas em lugar algum e fazem parte de um grupo sem o menor questionamento; as ideias óbvias assumidas por uma equipe (“Os mais experientes têm mais conhecimento que os mais novos aqui dentro” ou “A meta da equipe de vendas deve ser sempre desafiadora”) são alguns exemplos de premissas indiscutíveis que revelam como as pessoas pensam, sentem e percebem o seu ambiente. Questionar o óbvio pode, muitas vezes, chocar, mas é necessário no trabalho de mudança, principalmente na cultura organizacional.
Frequentemente, observamos diagnósticos sem a profundidade necessária para entender a cultura de um time ou organização. E uma grande confusão se instala com a criação de ações ou um plano de trabalho para efetuar as mudanças. “Vai começar por onde? Todos devem participar ou só a liderança? Quanto tempo demora? Como sustentar as mudanças propostas? Como medir se o trabalho está funcionando?” são questões relevantes que passam pela cabeça de todos os responsáveis por mudar alguma coisa dentro de uma organização. O primeiro passo para diminuir essas dúvidas é um bom diagnóstico, que considere o que é visível, mas também o que se esconde nos comportamentos de indivíduos e grupos.
Como localizar cultura dentro de uma organização?
Ao observar o trabalho de grupos, é quase impossível não observar a própria equipe que trabalha se perguntar: “Qual é a cultura do meu time?” Há alguns direcionamentos para nos ajudar a responder esta questão, três pontos fundamentais para compreender e localizar a cultura de um grupo, seja em um ambiente profissional ou fora dele.
O primeiro diz respeito ao tempo. “Este grupo já trabalhou junto o suficiente a ponto de resolver desafios significantes?” Devemos sempre avaliar qual a trajetória e história do time que estamos analisando – um time, por exemplo, que lidou com uma série de eventos desafiadores e se manteve unido, possivelmente tem mais coisas a dividir do que um time que apenas navegou por águas tranquilas.
O segundo é a maturidade. “O grupo já teve a oportunidade de resolver grandes problemas e, de fato, ver o resultado das soluções que implementaram?” No ambiente organizacional ágil e corrido, as pessoas são realocadas rapidamente após o fim de projetos e não têm a oportunidade de observar quais foram os resultados de suas ações, não se dão conta de suas próprias conquistas e não reconhecem, por completo, qual foi o trabalho do grupo que acabou de desempenhar.
Por fim, a dinâmica do grupo. “A equipe já aceitou novos colaboradores? Ou nunca incorporou ninguém?” O processo de socialização de novas pessoas diz muito (ou quase tudo) sobre a cultura de uma equipe. O tempo que se gasta em ambientação, a atenção dada, os tipos de treinamentos e acolhimento são relevantes para entender como a “tribo” aceita novos integrantes. É importante ressaltar que aqui não existem caminhos bons ou ruins, são apenas culturas diferentes que vão criar incentivos diferentes para relações e resultados.
Em um processo de mudança cultural, o gestor deve reconhecer se a cultura é homogênea ou se está fragmentada entre diversas equipes, cada qual com seus artefatos visíveis, valores e discursos não ditos, as famosas afirmações do tipo “Aqui na área X, trabalhamos assim, pode ir se acostumando…” Neste caso, é preciso fazer o “Mapa Cultural”, ouvindo todas as áreas e identificando diferenças e semelhanças na percepção da cultura organizacional. E a Gestão da Mudança deve estar atenta a este mapa, entendendo – além dos aspectos técnicos – os aspectos humanos que reforçam ou contrariam a cultura que se quer estabelecer.
O trabalho de mudança cultural é realmente enriquecedor e pode mudar a história de uma organização. Saber diagnosticar a cultura de um grupo e saber localizar a cultura dentro de tantos grupos diferentes, olhando para o todo e também para as particularidades, identificando o que é dito e o que é omitido, torna-se fundamental para qualquer profissional que queira ajudar em um processo de mudança cultural. As questões complementares que surgem são relacionadas a poder, história da organização e contexto externo, assuntos que abordaremos em um próximo artigo sobre mudança e cultura organizacional.
*Diego Silveira Paim é pesquisador no Núcleo de Gestão de Pessoas da USP, facilitador de grupos e condutor do Programa de Formação Líderes Agentes da Mudança.
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